quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Setembrite

Há algum tempo os vestibulandos haviam sido avisados sobre a febre denominada Setembrite, que pode acometer-los no mês de setembro e, na transição para outubro, transforma-se em Outubrite. Não há registros de Novembrite, os sintomas de esquizofrenia e loucura provenientes da febre acontecem somente até a outubrite; ouve-se gritos estranhos ecoando pelos corredores, surtos psicóticos, convulsões e risos desenfreados; mas as estatísticas apontam que, ao passar pela Outubrite e sobreviver aos surtos e pressões psicológicas, o aluno provou-se forte e capaz de enfrentar as tropas de choque que o aguardam no fim da linha.


Houve o caso de uma garota que acreditou que a Setembrite não passava de uma lenda, afinal, setembro já havia chegado e ela não sentira nenhum dos sintomas previamente descritos. Ela então preparou sua mala e se dirigiu ao local de prova com horas de antecedência. Ali armou acampamento: da sua mochila saíram armários, roupas, sapatos e, no banheiro, arrumou os shampoos e toalhas; ela inclusive arrumou a mesa para o almoço; sentou-se na cadeira e esperou; olhou no relógio e decidiu sair para voltar mais tarde, pegou um ônibus e foi para casa.


Ao desembarcar, percebeu que já era hora de voltar para a prova e se deu conta que não conseguiria chegar a tempo; pediu carona para seu pai, mas o carro estava quebrado. O desespero tomou conta da situação, o celular tocou, ela olhou no relógio e eram cinco e meia da manhã, levantou-se e começou a se preparar para a primeira aula de história. "Setembrite é lenda urbana", pensou a garota enquanto escovava os dentes.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

As coisas que o tempo diz

Percebo estar exageradamente preocupada com a minha idade. Preocupação essa que não reflete apenas sobre o aspecto físico, aquele medo dos inevitáveis efeitos da lei da gravidade sobre as belas curvas. Não, a crise atinge níveis mais profundos, relacionados à percepção de que o tempo avança e a vida parece ter ficado presa na ilusão da flor dos vinte anos.


Eu me formei, sou graduada. “Em que você se formou?” me perguntam. Minha formação é de Bacharel em Artes Visuais, não lembro os motivos exatos que me levaram a escolher esse curso, a verdade é que sempre tive certo apreço pela arte, mas foi o excesso de subjetividade nela contida que fez com que minha racionalidade com ela entrasse em desacordo.


“Você se arrepende de ter feito essa faculdade?” Não, não me arrependo. Eu não saberia que não encontraria o que procurava não tivesse feito eu a busca. Ademais, bagagem de conhecimento nunca entra em excesso. A maturidade que tenho hoje não é aquela de dez anos atrás, tampouco será a mesma que terei após começar e concluir outra graduação. “Ah, mas você não tem medo de descobrir de novo que esse curso não é o que você quer?” Medo? É claro que eu tenho medo, mas eu se eu não o fizer, ficarei na eterna dúvida. O medo deve servir para manter-nos prudentes, não estagnados; e como já afirmado anteriormente, não há aqui mesma menina que fez uma escolha anos atrás, essa vida agora é outra e minhas escolhas são sustentadas por uma base mais solidificada.


A crise que me acomete não é pelas escolhas que fiz ou deixei de fazer, mas o tempo que elas tomaram. Perdi-me no meio do caminho, passei longos anos sem um verdadeiro objetivo; encontrei a fotografia, apaixonei-me por ela e isso me proporcionou momentos únicos, incríveis e experiências inesquecíveis para toda a vida. Mas ainda faltava algo, um vazio não preenchido... eu quero outra faculdade, eu quero a USP.


Lembrei-me da literatura, e do professor que me despertou por ela o interesse: Fernando Teixeira, ou FT, como era carinhosamente chamado. Professor já falecido que deixou um buraco no mundo e um legado sem precedentes e, em mim, a semente que me faz buscar agora o caminho das letras.


Medo? Eu tenho medo. O caminho ainda não é claro, pensamentos despencam como uma avalanche de dúvidas e ideias. Vejo, no cursinho, professores da minha idade ou até mais novos, pessoas que se formaram quase no mesmo período que eu me formei, e penso que eu poderia estar lá, mas não estou; não estou porque me perdi no meio da jornada, andei por caminhos tortos até encontrar aquilo que pode enfim tirar-me da escuridão. Mas na escuridão em que me encontro, há um foco de luz: aprender, relembrar e reaprender coisas que há anos não tinha contato, além de reencontrar professores que me lecionaram há dez anos, me dá a força que me impulsiona para nunca deixar de procurar as respostas que nunca encontrei.