quarta-feira, 30 de maio de 2012

Escrevendo mea culpa

Hoje pela manhã li algumas palavras que me fizeram pensar. Repensar, na verdade, sobre coisas que sempre estiveram sob uma massa nebulosa e imprecisa orbitando minha mente e que, de repente,  tomou a forma de uma bigorna e atingiu em cheio a minha cabeça. Palavras de um texto de uma desconhecida, um comentário, uma “atualização de status”, que emergiram do famigerado e “inútil” Facebook (ou talvez inúteis sejam as pessoas que não sabem usá-lo) e trouxeram à tona reflexões há muito entorpecidas.


Não sei qual é meu papel neste mundo e, quanto mais tento buscá-lo, parece-me que mais perdida eu fico. Desorientada, bombardeada por informações e fontes de conhecimento sem saber para onde ou o que direcioná-las. E então eu escrevo. Escrevo para quê? Para quem? Por quê? Porque, já dizia o poeta Paulo Henriques Britto, “[...]a coisa dá prazer / Dá uma formidável sensação / (mesmo que falsa) de estar sendo ouvido.”  Escrever é gritar em silêncio e esperar que alguém ouça, é escolher as palavras certas na intenção de atingir ao menos uma pessoa e para ela fazer a diferença, assim como as palavras lidas na manhã de hoje me atingiram (e quem escreveu nem o imagina) e, nesse aspecto, as palavras, ainda que signos à frente de uma massa amorfa, têm um papel crucial.


Estamos rodeados de revolucionários de sofá, dispostos a compartilhar ideias e pensamentos na rede, mas sem ao menos refletir, colocá-los em prática ou trazê-los do virtual para a vida cotidiana. Carrego mea maxima culpa por não fazer mais do que escrever, mas talvez sejam a reflexão e a consciência os primeiros passos para uma mudança, seja lá de qual natureza for.


O Iluminismo nada seria não fossem aqueles que o teorizaram, o movimento não foi sozinho às ruas sem uma base para sustentá-lo. Longe de mim acreditar que estou concatenando palavras capazes de dar origem a uma revolução, apenas tento entender por que tanto escrevo, por que tanto busco algo que ainda não encontrei. Se isso alivia a consciência? É exatamente o oposto, ela deixa bem evidente a minha pequenez humana e o quão difícil é lidar com ela; quando um nível de consciência é despertado, ele jamais poderá adormecer novamente.


Eu preciso começar um livro, antes que eu perca a esperança (em mim e no mundo).

sábado, 26 de maio de 2012

O silêncio

O silêncio às vezes incomoda. Geralmente ele é combustível para uma imaginação desenfreada, daquelas a la égua ibera do Bentinho e, sem um mínimo de controle, pode gerar monstros que escapam por um portal causando destruição a esta realidade paralela. Ele transforma a mente em um campo minado ou um barril de pólvora à espera de um fósforo aceso.


Eu devo confessar que não me dou bem com o silêncio e, no momento em que escrevo, a vitrola roda Delicate Sound of Thunder. Muitas vezes, o silêncio é tão intenso que o barulho fica insuportável, tudo parece evoluir uma bateria de escola de samba dentro da cabeça, aí então um bom disco ajuda a afugentá-lo; e aquele suave arranhado proveniente do atrito entre a agulha e o bolachão conferem-me um pouco de paz.


As expectativas geradas pelo silêncio à espera de sua quebra podem te engolir; dominá-lo é uma arte e, uma vez controlado, tem-se aí um aliado. O silêncio é um espelho ou um lago cristalino e calmo que reflete um estado de espírito, toda a bagunça ou serenidade que ali aparecer dependerá exclusivamente do que lhe for defrontado; e o outro que me habita insiste em mostrar-lhe uma carranca.

sábado, 19 de maio de 2012

Brainstorm da morte


A mortalidade é algo difícil de encarar. "Aquilo que não nos mata, nos fortalece." Pode até ser, mas o que nos mata nos mata, e isso é dureza... O que é preciso fazer para a vida ter sentido? 


 Neil Gaiman, Sinal e Ruído.



Aquilo que acontece de acordo com o esperado deveria ser chamado de utopia, mas não é, porque a utopia, de fato, está em um plano além das possibilidades físicas, e nada acontece de acordo com o esperado. Esperar, então, é algo que se faz no plano das ideias: espera-se atingir algo que nunca será atingido, não da forma como é projetada mental e emocionalmente. Todos esperamos a morte. Não se sabe como, quando e nem onde, mas a ela chegará.  Se virá em cima de um cavalo, dentro de um capuz preto e empunhando uma foice, se é feia, se é bela, se será grandiosa ou apenas um beijo silencioso no meio da noite, no início da manhã ou ao longo do dia, não sabemos. Mas todos esperamos a morte. Esperamos, não ansiamos. Mas isso vai de cada um, alguns anseiam pela morte. A morte pode ser uma ótima fuga, ou talvez a sentença para uma prisão perpétua. A vida também pode ser uma fuga para a morte. Aliás, morte é vida, todos sabem que sim. É preciso que haja a morte para o equilíbrio da vida, ou ela acaba. Sempre foi assim. Essa é uma das poucas coisas que não mudam, sempre foi e sempre será assim. Algumas pessoas acreditam que outras coisas não mudam, mas não é verdade. Tudo, ou quase tudo, sempre muda. Até a morte muda. Antes morríamos muito cedo, agora morremos mais tarde; temos a ciência auxiliando nisso. Um dia ela vai descobrir um jeito de vivermos por tanto tempo que vamos ficar loucos. As pessoas não se aguentam por muito tempo. Em média vivemos menos de 100 anos e já estamos nos matando. Nós vamos passar dos 100, um dia vamos. Alguns já passaram, mas não devem aguentar muito. O que quero dizer é que nós ainda vamos ser jovens aos 100 anos. Os 200 serão os novos 80. Alguns cruzarão essa linha, outros morrerão antes. Mas seremos velhinhos aos 200 anos. E continuaremos nos matando, prolongando as desgraças humanas. Ou talvez tudo seja diferente, quem sabe? Nós vamos viver mais, teremos mais temo para aprender sobre o amor. Pode até ser que ele se revele e deixe de ser essa forma abstrata que aparece nos livros, na prosa, na poesia. Talvez caia a máscara cristã que o circunda e descubra-se que o amor é universal e, quem sabe, um Elemental. E aí paramos de nos matar, encontremos a paz. Mas, sem a guerra, não existirá paz. Não há no mundo senão diferenças, ou algo assim. Acho que estou deturpando Saussure. De qualquer forma, é a partir das diferenças que se sobressaem os significados. Sabemos o significado de paz porque conhecemos a guerra. Haverá sentido em um mundo sem dicotomias? Todos esperamos a morte, deixo essa pergunta aos meus descendentes.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Foi um acidente

Caminhava na beira do rio, curtindo a brisa e pensando que, de repente, mergulhar poderia ser bom; a água parecia limpa e, embora não fosse cristalina, estava convidativa. Entretanto, haviam certos receios: o rio poderia ser fundo e, se a correnteza estivesse forte, poderia carregar o corpo sabe-se lá para onde. Ademais, e se a água estivesse gelada? Aproximou-se lentamente e, cautelosamente mergulhou a ponta dos dedos para sentir a temperatura e pôde verificar que estava agradável, e então, chegou mais perto a fim de sentir um pouco mais. Um segundo de desatenção e tchibum! de roupa e tudo. Foi um acidente; quis evitar o hábito de mergulhar imediatamente, mas aconteceu contra a sua vontade. Agora a correnteza vai levando; e espera-se que não ocorra outro afogamento.