terça-feira, 31 de julho de 2012

Diálogo do Bandejão: A Invasão

[dois sentam à mesa]
– Nada como um dia após o outro, né?
– É...
– Não, é sério, você nunca sabe o que vem no dia de amanhã, pode acontecer qualquer coisa! De repente os alienígenas invadem o planeta, nos escravizam, e aí?
[chega o terceiro com a bandeja. Senta]
– O que vocês estão falando aí?
– Ele tá viajando aí com a ideia de uma invasão alienígena.
– Mas é sério, pô! Não tem como saber! Os índios, por exemplo, estavam vivendo aqui ha não sei quantos mil anos e, de repente, aparece aquela coisa no horizonte. Você acha que eles esperavam por aquilo? Veio do nada, de um dia pro outro mudou tudo.
– Aí pode aparecer alienígena para nos escravizar?
– Tudo pode acontecer.
– Não. Acho que antes eles vão começar a fazer trocas.
– Levarão nossos recursos naturais e ganharemos novos brinquedinhos tecnológicos.
– E aí nos escravizam.
– Não, primeiro vão nos catequizar.
– Com a grande religião cósmica?
– É isso aí.
[come. Muda de assunto]
– Blá , blá blá.
– Blá blá...
­[...]

terça-feira, 24 de julho de 2012

Desbarrancados

Era um dia normal, as pessoas dirigiam seus carros, olhavam seus relógios e ansiavam pela volta para casa. Aí os carros pararam, inclusive o meu. Peguei meu celular para olhar as horas e ele estava desligado. Nenhum carro se movia, e não era por causa do trânsito. Que droga! Eu já tinha sacado o que acontecera, só não queria acreditar. Pouco a pouco as pessoas foram saindo de seus carros e alguns, revoltados, atiravam seus celulares longe, praguejando. “Vamos embora daqui, gente”, disse eu para aqueles que estavam ao meu redor, “sendo otimista, não restará nada num raio de uns 30 km de onde ela caiu... ao menos não é possível avistar o cogumelo, o que deve nos dar alguma vantagem”, prossegui.


Alguns poucos me ouviram, os outros continuavam tentando religar seus carros e se recusavam a deixá-los para trás. Eu simplesmente tranquei a porta do meu por hábito e levei as chaves comigo. Algumas pessoas começaram a cair, e eu fiquei com medo, muito medo, apesar de minha aparente calma. Eu e os poucos que me acompanharam chegamos a um barranco, não havia nada a perder, a radiação parecia se espalhar e resolvemos descê-lo antes que ela nos abatesse completamente. Era tão íngreme e escorregadio que despencamos, acho que demorou pelo menos uma hora escorregando, surpreende-me que tenhamos chegado vivos até ali. De qualquer forma nada tivemos a perder, a essa hora já teríamos morrido se tivéssemos ficado para trás.


Chegamos a uma mata fechada e percebi que meus olhos ardiam; alguns de meus companheiros já não podiam mais ver. Avistamos uma casa com a porta entreaberta. “Seja lá quem for o dono desta casa, parece tê-la abandonado” A cama estava no quintal e, exaustos, alguns se debruçaram nela e por ali ficaram. Eu resolvi explorar o interior da casa, se era para esperar algum resgate, que fosse com algum conforto. Foi quando percebi que o chuveiro estava ligado e alguém cantava lá dentro. Voltei para o quintal e disse:


 – Acho que não podemos ficar aqui, o dono parece estar lá dentro.


– E que alternativa temos – retrucou alguém cujo rosto não identifiquei.


– Não sei, mas a casa não é nossa.


– Quando não se tem nada a perder, por tudo se pode lutar. Vamos ficar.


Eu sabia que ele estava certo. Morreríamos todos, cedo ou tarde. E, enquanto o proprietário misterioso continuava a cantar no chuveiro, resolvi abrir a porta da frente da casa. Deparei-me com um condomínio fechado e avistei outras casas iguais à que estávamos. Crianças brincavam na rua e pareciam não desconfiar do que havia acontecido. Tornei a fechá-la. Na sala, meus companheiros me observavam, colocando a mesa para jantar. Eu já nem me lembrava por que estava ali, nem como eu havia chegado, mas sem dúvida, aquele era meu lar. Não havia mais ninguém tomando banho. A imagem à minha frente se esvaiu, tudo ficou branco, de repente preto. Acordei confusa.

domingo, 22 de julho de 2012

Diálogos do Trem - As crianças e seus adultos

Diálogo 6: Amor de mãe e filho

– Você tá com 38 quilos, daqui a pouco tá com 40! Vai virar uma bola.
– E você daqui a pouco vira uma jamanta.
– Jamanta eu já tô.
– Vai virar uma baleia então! Uma baleia fora d’água!
[mãe mostra a língua]
[silêncio]
– Eeeei! Coisa feiaaaa! – diz a mãe.
[filho mostra a língua]
– Feio, horrorosoooo! Lá, lá, lá...
[filho mostra mais a língua]
– Nossa, parece um macaco!

Diálogo 7: O doce aroma do Rio Pinheiros

[som de ânsia de vômito]
[fala uma menina]
– Ai que cheiro de cocô...
[repete o som de ânsia de vômito]
[menina continua a falar]
–Ai... passa logo esse fedô... Mãe! Manda esse ônibus [?!?!] ir mais rápido... argh.
[muitos narizes se escondem nas camisetas]

Diálogo 8: Uma viagem pra lá de espe(a)cial

[menina se debruça na janela]
– pizzzz ziiummmm pi pi prrrr  Vejam, vejam só! Que vista boa nós temos aqui! É possível ver toda a Terra! Que coisa mais linda...
– Ver a Terra? Do que você está falando, menina?
– Nós estamos em uma nave espacial que saiu do planeta Bink!
– Ah... é?
– Olá, sou um visitante do planeta Bink.. pi pi prrr piiii! Eu vim em paz, mas.. adeus! Eu tenho que voltar. Pi pi prrrr zzzzzzz ssshhhh olha só onde agora estou! Que mundo lindo! Que maravilha, posso visitar vários mundos! Pi pii prrrrr pi zzzz Estamos avistando mais um planeta! Será Marte? Pi pi prrrr Oh, não! Invasão! Invasão!
– Volte ao planeta Terra agora, temos que descer.
[avó puxa a mão da menininha]
– Mas os aliens! Os aliens estão chegando! Pare!!
– Vamos logo, menina!
– Oh não, os aliens estão invadindo...
[irmão chato intercede]
– Eu vou estourar isso [segura o balão vermelho da menina] se você não ficar quieta!
– Para! Eu tô no meu mundo... Ahhhhhhh! Você é o alien que invadiu o meu mundo!

terça-feira, 17 de julho de 2012

O dia do pagamento

Você chegou à metade do mês, seu salário há muito já foi embora ou então, fazendo as contas, percebe que, proporcionalmente, já gastou muito mais por dia do que conseguirá gastar a partir de agora. Aí você aperta as calças, deixa de sair e reza para que o dia do próximo pagamento chegue logo. Reza para que os dias passem rápido, muito rápido. Deseja que as horas corram, que os dias voem. E ai o tão esperado pagamento chega. E o dinheiro, de novo, vai embora. E tudo se repete. Depois reclama que a vida é curta!

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Mais um caso de amor

Ela caminhava observando o local, olhava admirada tudo o que estava à sua volta, alguns flertes eram inevitáveis, e ela gostava, sentia-se atraída, mas continuava apenas a observar. Foi quando ela o viu. Tudo ali, de repente, pareceu-lhe escuro e apenas ele se destacava à sua frente. Caminhou em sua direção, fez menção de tocar-lhe a fronte, mas hesitou, recolheu a mão, o braço, olhou para baixo e se virou na direção oposta. Ele então lhe disse:


– Não vá embora, fique. Eu estava esse tempo todo esperando por você.


– Eu não posso... – ela respondeu.


– Por quê? Eu bem vi como você me olhava.


– Eu simplesmente não posso!


– Mas eu sei que você me quer, pense nas noites incríveis de prazer que podemos ter juntos.


– Eu, eu... não tenho tempo para isso!


– Ora, claro que tem, eu bem conheço o seu tipo, e sei que você não resiste a tipos como o meu.


– Você não sabe o que está dizendo...


– Ora, claro que sei! Vamos, aproxime-se, venha, veja como sou bonito, robusto... mas, o mais importante, eu também tenho conteúdo e muito a lhe oferecer.


– Você me provoca...


– Não resista... vamos embora daqui juntos, você não vai se arrepender.


– Você deve saber que o meu coração não pode ser de um só.


– Eu sei aguardar o meu momento, eu sei esperar, logo você perceberá quanto tempo perdeu até me encontrar.


Ela não podia resistir, sabia que ele estava certo. Eles sempre estão certos, mesmo que não dure muito, sempre valia a pena a experiência, era algo irresistível, incontrolável. Ela não podia mais aguentar e o agarrou. Após os momentos de admiração mutua, levou-o consigo.


Quando ela chegou ao seu quarto, ela ainda estava abraçada a ele. Com carinho, disse-lhe.


– Mal posso esperar para estar só com você.


Acariciou-o e colocou-o junto aos outros na estante. Logo após, voltou para a cama e pegou o outro livro que a esperava ansiosamente por mais uma noite de puro prazer.