terça-feira, 24 de maio de 2011

Com as mãos no volante

Acordou confusa, eram cinco e meia da manhã. Não lembrava por que o celular havia despertado tão cedo, quando tudo clareou em sua mente: era hora de ir para a aula de direção. Tudo que ela queria era voltar para cama, e de se imaginar atrás daquele volante, um frio subia-lhe à espinha. Era sempre a mesma sensação, toda vez que ela tinha que ir para aula, lembrava das mudanças de marcha, tinha pesadelos com as setas e os retrovisores que lhe mostravam monstros prestes a devorar o veículo que conduzia.


Estava frio, a cabeça doía, o corpo cansado da noite mal dormida não se animava com o que estava por vir. Como de costume, ela entrou no veículo esperando que aquilo acabasse logo. Sentou, acertou o banco, colocou o cinto de segurança e ajustou os retrovisores. Assinou a papelada que o instrutor lhe entregara e ligou o carro.


Ao colocar as mãos no volante, aconteceu. O contato com o carro havia transformado seu estado de espírito, o poder daquela maquina fora conduzida ao seu corpo através de seus braços e, como uma força sobrenatural, possuíra-a. O brilho dos olhos já não era mais o mesmo, havia algo irreconhecível em seu olhar. O instrutor havia sumido. Sentia o ímpeto incontrolável de seguir adiante; uma estrada surgiu à sua frente e ela esqueceu o pé no acelerador. Nada conseguia detê-la, a vontade era do carro, ela apenas obedecia, obedecia e gostava, e quanto mais gostava, mais obedecia, quanto mais obedecia, mais a vontade do carro se intensificava e mais ela sentia. Gigantes ameaçadores sobre rodas a ameaçavam, ela ria, gargalhava, o brilho em seus olhos se intensificava e, com mais vontade, prosseguia.


Então tudo se apagou. Soltou o volante e instrutor reapareceu ao seu lado; olhou para ela e lhe disse “Tudo certo, você está indo muito bem! Vamos voltar?”. Levantou cansada, cedeu o lugar do condutor ao instrutor. Com os olhos fundos e o corpo fadigado, disse: “Não vejo a hora de isso tudo acabar.”

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